lundi 28 février 2011

Bilíngue pra bilíngue: a tradução em cena

Andei pensando nos últimos tempos em escrever um livro de poesia bilíngue, mas não um livro bilíngue de poesia: não nos moldes que sempre se viu e vê, não com simples traduções dos poemas pra que aquele que não entende a língua do original possa aprendê-la, compará-la ou, o que é mais corrente, ignorá-la, ler o livro como se as paginas pares – as da esquerda, aquelas nas quais se encontram os escritos em língua estrangeira – fossem meramente ilustrativas. Algo semelhante já pode ser encontrado no cinema, por exemplo, em um filme do qual falarei mais ao fim desta blog-nota (, ou seja, quem não tiver tempo pra ler tudo, pode pular direto pro fim, logo pro vídeo postado abaixo – que já tem la seus bons sete minutos – ou pro paragrafo antes dele..).
A ideia seria escrever, criar, parir textos bilíngues mais ou menos simbióticos, onde nenhuma das duas línguas é de partida ou de chegada, e sim um dialogo traçado numa via de mão dupla, uma bi-parturição ou bi-partição, ou bi-partitura. No fim das contas, é verdade que toda tradução não é nada mais que isso, um dialogo; ademais, todo e qualquer texto é um dialogo, dialogo com tantos outros textos que o escritor leu durante a vida e que, consciente ou inconscientemente, se inserem naquele que esta sendo escrito, além de ser, também, um dialogo com outros textos não verbais ou só oralmente verbalizados, em mundos palpáveis ou imaginários.
No entanto, voltando ao projeto do livro bilíngue pra bilíngue, o intuito seria obter textos que, embora independentes de suas traduções, pudessem oferecer uma outra leitura – complementar, potencializante, mas também independente – na tradução, graças aos diferentes potenciais de cada uma das línguas e das culturas em jogo (talvez como as transcriações de Haroldo de Campos, ou um pouco mais além). A prova de fogo do livro seria fazer com que o leitor – ideal, que deveria dominar as duas línguas – não conseguisse distinguir o original da tradução, ou a tradução do original, ou melhor, o original traduzido da tradução originalizada. Portanto, com essa visão da tradução como algo que ultrapasse a mera comunicação, a simples (re)transmissão de uma mensagem, o tradutor – no caso, até agora, o auto-tradutor (à la Beckett, mais ou menos), pois eu mesmo escreveria as duas (ou mais) versões – seria também um autor, ou um bi-partidor, um produtor (e catalizador) de bi- (ou multi-) partições textuais, uma espécie de diretor, de regente, de maestro que seguisse partituras distintas de uma só vez, além de conduzir e ser conduzido por distintas vivências e maneiras de tocar advindas de cada instrumentista que compõe a orquestra. Assim, mais (ou menos) que autores, tanto o maestro quanto a orquestra tornar-se-iam atores, juntamente com outros a(u)tores ainda mais importantes – sem os quais nada disso existiria: as duas línguas em questão.
Pra concluir, com tudo isso em mente, encontrei um curta-metragem que muito me agradou e que brinca com algo semelhante, aquele que mencionei mais acima. Trata-se de um filme de Fábio Durand, lançado em 2000 – se não me engano, apesar do roteiro ser de 1997 – e bastante merecedor dos prêmios recebidos, seja pela originalidade (tradutiva), seja pela realização e pela atuação, embora apresente algumas falhas em vários desses mesmos aspectos:
Não acredito que seja indispensável o domínio das duas línguas pra se compreender o curta, mas, como dizia, a tradução – a legenda, aqui – não é uma mera (re)transmissão de uma mensagem, e o conhecimento das duas línguas permite uma apreciação mais fina do todo e dos detalhes: apreciam-se melhor os questionamentos, os jogos – bem (ou nem tão bem) sucedidos – de linguagem, os jogos de cena que as legendas – também – encenam.

mardi 22 février 2011

Justin Bieber: Panis et circenses

Não, Justin Bieber não regravou – e nem acredito que um dia venha a regravar – a mitológica “Panis et circenses” dOs Mutantes, que já deve ter lá uns quarenta anos, quase três vezes a idade do novo pop-star. Não, o assunto sugerido pelo título tem mais a ver com o pão e o circo do império romano - e, atualmente, mediático - do que com música. (Aliás, ligeiros parênteses para os latinistas: pensando nos casos do latim, a expressão correta seria “panem et circenses”, não? E minha dúvida não vem das minhas poucas lembranças de estudo da língua, mas simplesmente porque o Google quis me corrigir quando eu procurei pelo título da canção...)
O que conta – e conto – aqui, na verdade, é que, no último fim de semana, o jovem cantor participou de um jogo de basquete da NBA (National Basketball Association – “national” significando “dos EUA”, liga onde o campeão recebe o presunçoso título de “world champion”, “campeão do mundo”...), e Bieber, já um vencedor dos vídeos virais internáuticos, ainda foi considerado o melhor jogador, o mais valioso da partida, o MVP (most valuable player), mesmo com a derrota do seu time e com vários dos demais participantes bem mais brilhantes que ele:
Confesso que, pra um menino – dedicado à música (boa ou má, pouco importa...) – jogando no meio de gente grande, até que ele não foi nada mal; mas deu uma dozinha do garoto, que, além de ter chegado direto ao evento depois de treze horas de voo após um show seu, tomou umas pequenas pancadas dos grandões:
Pra quem não conhece o tal evento da NBA, trata-se de reunir, pra uma partida amistosa, uns seis jogadores profissionais aposentados, umas duas profissionais em atividade na WNBA (a versão feminina da NBA) e uns tantos atores, cantores e afins, todos estes homens, considerados, portanto, aptos a brincar - pau a pau (...) - com algumas das melhoras jogadoras do mundo... No entanto, deixando de lado a discussão sexista, pensemos mais no caráter  mediático e comercial do trem, do troço, do treco, ou – pra empregar uma palavra-ônibus que conjugue melhor com a situação – do negócio.
Nunca vi um jogo pior na vida – talvez só aqueles em que eu mesmo participava (...) – , e, mesmo assim, imagino que deve ter dado bastante IBOP, já que o primeiro vídeo que postei aqui, o dos melhores momentos de Justin Bieber, teve mais de um milhão de visitas em menos de uma semana. Aliás, não é à toa que o jovenzinho ganhou o prêmio de melhor jogador, ainda que tenha perdido a partida: os espectadores é que escolhiam, votavam no seu favorito pela Internet e pelo celular, ferramentas que fazem parte, principalmente, do cotidiano da faixa etária – dos fãs – do músico MVP.
Bom, em poucas palavras – pois, no fim das contas, nem sei se vale a pena eu (te fazer) perder tempo com tantas – , embora seja mais importante competir do que ganhar, pra se tornar o mais valioso da partida – ou da partitura – , prepare bem o seu circo pro público, que o circo é já o pão de hoje em dia, até praqueles que mal têm dinheiro pra comprar o pão pra se nutrir enquanto assistem à TV, que essa, sim, dá-se sempre um jeitinho de arrumar uma...

dimanche 20 février 2011

O discurso do rei, Cisne negro etc. e tal

Há muito, há um mês e alguns dias – pra ser mais ou menos preciso – , não havia postado coisa alguma por aqui, pois não me encontrava por aqui. Prum pouco mais de precisão, agora em relação ao último fato, eu não me encontrava próximo ao computador por meio do qual escrevo neste momento. É vero que “por aqui”, podendo querer dizer “aqui na Internet”, eu poderia me manter “por aqui” onde quer que estivesse, desde que aqui – ou melhor: ali – houvesse um computador e Internet; e havia. Mas eu estava por aqui (!) com tudo isso, com tudo isso de ficar como que fisgado na rede mesmo nas férias, e eu queria férias, férias completas: tinha tirado férias de tudo aquilo que faço quando não estou de férias, excetuando umas poucas atividades que me são indispensáveis, mesmo de férias: ler, escrever, escutar música e assistir a filmes – além de comer, beber, amar e adjacências tais quais respirar e fumar, ou respirar fumando, na maior parte do tempo...
E, junção de várias dessas atividades ocorreu-me assistindo a dois filmes no cinema: O discurso do rei e Cisne negro. Pra melhor me explicar, os dois filmes se lêem (cada um à sua maneira) como livros – graças a seus roteiros tão finamente ciosos da linguagem verbal (e de outras linguagens) – , escrevem-se – como palavras que vão se cadenciando pouco a pouco no cérebro, feito num passeio por uma floresta de signos linguísticos – , escutam-se como discursos musicais – … – , podem ser assistidos e assistirem como poucos filmes podem assistir a (+ a = à) assistência a respirar – e (por quê não?) a fumar um bom cigarro na saída da sala.
Quanto aO discurso do rei, não vou dizer mais coisa alguma,

e pouco mais que coisa nenhuma é o que direi sobre o Cisne negro,
um dos melhores filmes que vi ultimamente: (citando-o, em parte: “)senti, fui per-feito(”), des-feito, re-feito, estupe-feito por ele, embora O discurso do rei conte com uma melhor nota no site (ironicamente intitulado) www.rottentomatoes.com (traduzindo o nome: tomates podres), o que deveria figurar como a razão de ser deste texto, já que o objetivo do blog é reciclar assuntos, vídeos, imagens, artigos ou, menos precisamente, inspirações (em geral) que possam ser encontradas na Internet, como esse site em que se reúnem críticas de arte advindas dos mais variados lugares e suportes. Na verdade, tudo pode ser encontrado na Internet, o que quer dizer que, mesmo que a inspiração pra alguns destes textos meus venha, num primeiro momento, de uma experiência real, dou-me o direito de procurá-la, em seguida, no mundo virtual e transcriá-la neste NetNoteBook, neste CarNet, nesta CaderNet...
Injusto? Injusto partir do real e, só depois, transferi-lo ao virtual, sendo que meu projeto inicial era dar voltas e mais voltas dentro da net e jamais sair dela? Injusto quebrar minha própria regra, minha regra primeira, a regra que distinguiria meu blog de tantos outros?...
Injusto, sim – somente se eu não acreditasse que “um personagem de um livro é tão real quanto um personagem real”, se não concordasse com Georges Perec, de quem tiro a citação anterior, pra quem o virtual e o real se acomodam no mesmo e único plano, nem que seja mental, o que o faria, por conseguinte, real, físico, corpóreo: a mente, este lugar, esta coisa impalpável, quase fictícia, possuímo-la no corpo e ela nos possui, de fato, de corpo e mente – e alma...
Injusto seria deixar de reciclar tais filmes e tomates podres pelo ilegítimo motivo de desejar erguer um muro entre mundos que não são fronteiriços, e, sim, imbricados uns nos outros, somente pra ser um quase nada original na empreitada.
Injusto, por fim, seria deixar de mencionar o divertido pseudo estudo científico de Perec sobre os efeitos tomatotópicos – ou seja, sobre os efeitos dos tomates jogados – numa soprano (leia o artigo), o qual me veio à cabeça enquanto eu investigava o www.rottentomatoes.com, mas que, originalmente, eu havia lido em um livro, não na Internet. Injusto seria eu me privar e privar o leitor de qualquer conexão pertinente entre realidades e virtualidades tão diversas quanto a frente e o verso, quanto o verso e a prosa, quanto o prosáico e o poético, quanto o náutico e o internáutico, quanto aquilo que é interno e aquilo que é externo a uma coisa qualquer, a qualquer coisa... Injusto seria eu tirar férias de tudo isso que, em mim e em minha pena – digital – , se (con)fundem sem pena alguma. Injusto seria eu tirar férias de mim; não tirar férias das férias; prolongar as férias da escrita simplesmente porque, durante esse mês e pouco de férias, não tirei um tempinho pra Internet, nem mesmo pra responder aos e-mails dos amigos – aliás, peço que me perdoem a ausência.